A pedido de Várias familias vamos reactivar este espaço muito em breve
Vamos estar na Feira de Santa Iria em Faro até ao dia 29 de Outubro,esperamos a sua visita

Alentejo

O Alentejo
Palavra mágica que começa no Além e termina no Tejo, o rio da portugalidade.
O rio que divide e une Portugal e que, à semelhança do homem Português, fugiu de
Espanha à procura de mar
O Alentejo molda o carácter de um homem. A solidão e a quietude da planície dão-lhe a
espiritualidade e a paciência do monge; as amplitudes térmicas e a agressividade da
charneca dão-lhe a resistência física, a rusticidade, a coragem e o temperamento do
guerreiro. Não é alentejano quem quer. Ser alentejano não é um dote, é um dom. Não se
nasce alentejano, é-se alentejano
Portugal nasceu no Norte, mas foi no Alentejo que se fez o homem. Guimarães é o
berço da Nacionalidade; Évora é o berço do Império Português. Não foi por acaso que
D. João II se teve de refugiar em Évora para descobrir a Índia. No meio das montanhas
e das serras, um homem tem as vistas curtas; só no coração do Alentejo, um homem
consegue ver ao longe. Mas foi preciso Bartolomeu Dias regressar ao reino, depois de
dobrar o cabo das tormentas, sem conseguir chegar á Índia, para D. João II perceber que
só o costado de um alentejano poderia suportar o peso de um empreendimento daquele
vulto. Aquilo que, para o homem comum, fica muito longe, para um alentejano, fica já
ali. Para um alentejano, não há longe, nem distância, porque só um alentejano percebe
intuitivamente que a vida não é uma corrida de velocidade, mas uma corrida de
resistência onde a tartaruga leve sempre a melhor sobre a lebre. Foi, por esta razão, que
D. Manuel decidiu entregar a chefia da armada decisiva a Vasco da Gama. Mais de dois
anos no mar… e, quando regressou, ao perguntarem-lhe se a Índia era longe, Vasco da
Gama respondeu: «Não, é já ali.». O fim do mundo, afinal, ficava ao virar da esquina
Para um alentejano, o caminho faz-se caminhado e só é longe o sítio onde não se chega
sem parar de andar. E Vasco da Gama limitou-se a continuar a andar onde Bartolomeu
Dias tinha parado. O problema de Portugal é precisamente este: muitos Bartolomeus
Dias e poucos Vascos da Gama. Demasiada gente que não consegue terminar o que
começa, que desiste quando a glória está perto e o mais difícil já foi feito. Ou seja,
muitos portugueses e poucos alentejanos
D. Nuno Álvares Pereira, aliás, já tinha percebido isso. Caso contrário, não teria partido
tão confiante para Aljubarrota. D. Nuno sabia bem que uma batalha não se decide pela
quantidade mas pela qualidade dos combatentes. É certo que o rei de Castela contava
com um poderoso exército composto espanhóis e portugueses, mas o mestre de Avis
tinha a vantagem de contar com meia-dúzia de alentejanos. Não se estranha, assim, a
resposta de D. Nuno aos seus irmãos, quando o tentaram convencer a mudar de campo
com o argumento da desproporção numérica: «Vocês são muitos? O que é que isso
interessa se os alentejanos estão do nosso lado?»
Mas os alentejanos não servem só as grandes causas, nem servem só para as grandes
guerras. Não há como um alentejano para desfrutar plenamente dos mais simples
prazeres da vida. Por isso se diz que Deus fez a mulher para ser a companheira do
homem. Mas, depois, teve de fazer os alentejanos para que as mulheres também
tivessem algum prazer. Na cama e na mesa, um alentejano nunca tem pressa. Daí a
resposta de Eva a Adão quando este, intrigado, lhe perguntou o que é que o alentejano
tinha: «Tem tempo e tu tens pressa.»
Até porque os alentejanos e o Alentejo foram
feitos ao sétimo dia, precisamente o dia que Deus tirou para descansar
E até nas anedotas, os alentejanos revelam a sua superioridade humana e intelectual. Os
brancos contam anedotas dos pretos, os brasileiros dos portugueses, e os franceses dos
argelinos… Só os alentejanos contam e inventam anedotas sobre si próprios. E
divertem-se imenso, ao mesmo tempo que servem de espelho a quem as ouve.
Mas, para que uma pessoa se ria de si própria, não basta ser ridícula, porque ridículos
todos somos. É necessário ter sentido de humor. Só que isso é um extra só disponível
nos seres humanos topo de gama. Não se confunda, no entanto, sentido de humor com
alarvice. O sentido de humor é um dom da inteligência; a alarvice é o tique da gente
bronca e mesquinha. Enquanto o alarve se diverte com as desgraças alheias, quem tem
sentido de humor ri-se de si próprio. Não há maior honra do que ser um objecto de uma
boa gargalhada. O sentido de humor humaniza as pessoas, enquanto a alarvice diminuias.
Se Hitler e Estaline se rissem de si próprios, nunca teriam sido as bestas que foram
E as anedotas alentejanas são autênticas pérolas de humor: curtas, incisivas, inteligentes
e desconcertantes, revelando um sentido de observação, um sentido crítico e um poder
de síntese notáveis. Não resisto a contar a minha anedota preferida.
Num dia em que chovia muito, o revisor do comboio entrou numa carruagem onde só
havia um passageiro. Por sinal, um alentejano que estava todo molhado, em virtude de
estar sentado num lugar junto a uma janela aberta. «Ó amigo, por que é que não fecha
a janela?», pergunto-lhe o revisor.
«Isso queria eu, mas a janela está estragada.» Respondeu o alentejano.
«Então porque é que não troca de lugar?»
«Eu trocar de lugar, trocava … mas com quem?»
Como bom alentejano que me prezo de ser, deixei o melhor para o fim. O Alentejo,
como todos sabemos, é o único sítio do mundo onde não é castigo uma pessoa ficar a
pão e água. Água é aquilo por que qualquer alentejano anseia. E o pão… Mas há melhor
iguaria do que o pão alentejano? O pão alentejano come-se com tudo e com nada. É
aperitivo, refeição e sobremesa. E é o único pão do mundo não tem pressa de ser
comido. É tão bom no primeiro dia como no dia seguinte ou no fim-de-semana. Só
quem come o pão alentejano está habilitado para entender o mistério da fé. Comê-lo
faz-nos subir ao céu!
É por tudo isto que, sempre que passeio pela planície numa noite quente de verão ou
sinto no rosto o frio cortante das manhãs de Inverno, dou graças a Deus por ser
alentejano. Que maior bênção poderia um homem almejar?